por Fernando Cardoso e Michael Hafran Filardi - Orientação e Coordenação Pedagógica da Escola Viva
Mas, afinal, onde estão os celulares na foto que ilustra este texto?
Você encontrou algum?
E não encontrará mesmo!
Pois na Semana do Projeto Desconectar, nos desconectamos!
Uma semana longe das telinhas
O Projeto Desconectar da Escola Viva consiste em deixar jovens de 6º e 7º anos - grandes frequentadores dos meios virtuais - longe das telas durante uma semana por mês.
Ufa, que desafio! Mas que delícia de desafio!
Nessa semana - que tem mensalmente data pré-definida para acontecer - as propostas de atividades diversificadas privilegiam a interação humana, o convívio com os amigos e amigas, com familiares…o olho no olho!
Teve até banho de mangueira promovido pelo nosso querido monitor Zeca.
O projeto piloto tem feito muito sucesso por aqui e, em breve, deve também estender seu abraço às demais séries.
Celular fora da mochila…e da vida
Na Semana Desconectar os celulares não entram no material escolar.
O uso do celular na escola fica totalmente proibido (isso mesmo, pro-i-bi-do!), inclusive nos momentos de entrada, almoço e saída.
E também engajamos as famílias no projeto, recomendando que os aparelhos também sejam desligados em casa.
Abraçadas pela proposta, as famílias também foram convidadas a desconectar e a realizar, junto com seus filhos e filhas, esse mesmo exercício.
Resgatamos algumas atividades "desplugadas" e saudáveis que podem ser realizadas em casa e ajudar as famílias a reencontrarem esse maravilhoso prazer que é estar em família sem precisar, necessariamente, da mediação das telas.
O que disseram as crianças?
Na primeira semana do Projeto Desconectar, alguns estudantes deram um depoimento sobre como tinha sido a semana longe dos celulares na escola, alguns deles foram:
“Foi uma semana muito divertida, teve banho de esguicho, também teve o slackline. Foi muito legal, eu joguei vôlei, e eu era muito apegada ao celular. Eu não fazia nada disso, porque eu só ficava grudada no celular, eu não falava com praticamente ninguém e, nessa semana, eu brinquei de praticamente tudo até de futebol. Então, para mim, foi muito legal!” (aluna do 6° ano)
“Foi um pouco diferente, mas está sendo muito legal, porque a gente está fazendo novas amizades com as outras pessoas e é isso! Está tendo xadrez, que eu gosto muito, e aqui não tinha, tinha só na minha escola antiga.” (aluna do 6° ano)
“Mudou muita coisa para mim, porque eu usava bastante o celular na escola ponto e agora eu tô fazendo outras coisas, fazendo novas amizades conversando mais com os outros eu fiquei vendo meus amigos jogando xadrez e conversando. Ah, eu gostei!” (aluno do 7° ano)
“Eu acho que, de vez em quando, algumas pessoas que não estavam no celular ou não estavam na tela, estavam brincando. Mas as pessoas que estavam no celular ficavam lá mais isoladas. E aí, quando ninguém pode trazer o celular para escola, todo mundo fica mais junto, eu acho que une todo mundo. Achei bem divertido, porque aprendemos novas brincadeiras, a gente tá conversando mais.” (aluno do 7° ano)
Conexão, mas de outra natureza
Passeios em família. Um respiro para redescobrir os ricos espaços culturais na nossa cidade. Talvez uma volta de bike no parque, desfrutar de momentos cada vez mais raros em contato com o meio natural.
Que tal uma imersão em uma biblioteca? Passear entre as lombadas coloridas, explorar os títulos, sentir o cheiro das publicações…que delícia.
Jogos de tabuleiros, uma corrida de rolimã, esportes ao ar livre… são infinitas as possibilidades, mas, muitas vezes, nos esquecemos delas.
Abduzidos pelo mundo virtual, muitas vezes, podemos nos esquecer de como são boas e saudáveis todas essas essas alternativas.
Afinal, o desafio é mergulhar em qualquer atividade que não dependa da mediação de um aparelho de celular.
“Incluir momentos de desconexão e mais convivência familiar entre os filhos, explicitando as situações de refeições e preparação para dormir como momentos de desconexão” - é uma das orientações do Guia para famílias em todas as idades, de 0 a 18 anos - da Sociedade Brasileira de Pediatria.
A tecnologia é a vilã?
Os amigos e amigas moram no celular.
Os jogos desafiam no notebook.
A agenda social é ditada pelas redes sociais.
Os eventos acontecem online.
O consumo excessivo do digital, nas suas mais diferentes formas, porém principalmente o uso de celulares, tem se tornado preocupante, seja no ambiente escolar ou fora dele.
Não são raras as vezes em que nos deparamos com crianças e jovens com o rosto colado “nas telas” e se envolvendo em conflitos que poderiam não existir se o uso do celular fosse mais limitado.
No Folhateen de 23/4, estudantes da Escola Viva e de outras escolas falaram sobre o assunto - Adolescentes contam o que causa ansiedade ao usar Whats, Insta e TikTok.
Uma geração ansiosa
O livro “A geração ansiosa: Como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais” do psicólogo social Jonathan Haidt - citado na reportagem - e recém publicado no Brasil - tem deixado adultos do mundo todo atentos e preocupados.
“As crianças e os adolescentes estão em perigo. Desde o início dos anos 2010, as taxas de depressão, ansiedade e outros transtornos mentais têm crescido vertiginosamente nesses grupos. Em A geração ansiosa , o psicólogo social Jonathan Haidt explica as causas dessa epidemia e defende uma infância longe das telas.
O autor demonstra como a “infância baseada no brincar” entrou em declínio na década de 1980 e foi substituída pela “infância baseada no celular”, acompanhada por uma hiperconectividade que alterou o desenvolvimento social e neurológico dos jovens e tem causado privação de sono, privação social, fragmentação da atenção e vício. Ele também examina por que as redes sociais prejudicam mais as meninas e os motivos que levam os meninos a migrar do mundo real para o virtual, com consequências desastrosas para eles e as pessoas ao seu redor.
Diante desse cenário catastrófico, Haidt mostra o que pais, professores, escolas, empresas de tecnologia e governos podem fazer na prática para reverter a situação e evitar danos psicológicos ainda mais profundos. Um plano de ação que não podemos nos dar ao luxo de ignorar, porque o que está em jogo não é apenas o bem-estar de nossas crianças, mas da sociedade como um todo.” (texto de apresentação da obra na Amazon)
A infância precisa da tecnologia?
Desde 2012, a pesquisa TIC Kids Online Brasil mapeia as tendências de uso das TIC (tecnologias de informação e comunicação) por crianças e adolescentes.
Uma pesquisa publicada em 2023 indica uma diminuição na idade dos primeiros acessos à internet e também aponta: 95% da população - de 9 a 17 anos - é usuária de Internet.
Segundo os dados, hoje cerca de 1/4 das crianças brasileiras iniciaram sua vida on-line antes dos 6 anos.
Segundo o ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente:
“Os direitos das crianças e adolescentes estão relacionados a experiências que não necessitam de mediação da internet: direito à liberdade, ao respeito e à dignidade; ser protegido da violência física ou psicológica; direito à convivência familiar e comunitária; direito à educação, esporte e lazer.”
E o que pensa a Sociedade Brasileira de Pediatria sobre o assunto?
A Sociedade Brasileira de Pediatria, também preocupada com o tema, elaborou Guias com orientações para o resgate dos parâmetros alargados com o período da pandemia.
Os Guias apontam algumas ações práticas:
- Evitem a exposição de crianças menores de 2 anos às telas.
- Para crianças entre 2 e 5 anos, limitem o tempo de telas ao máximo de 1 hora/dia, com supervisão de responsáveis.
- Para crianças entre 6 e 10 anos, limitem o tempo de telas ao máximo de 1-2 horas/dia, com supervisão de responsáveis.
- Para adolescentes entre 11 e 18 anos, limitem o tempo de telas e jogos de videogames a 2-3 horas/dia, e nunca deixem “virar a noite” jogando.
O Guia lista ainda alguns fatores de proteção para minimizar riscos relacionados ao desenvolvimento dos Principais Problemas Médicos de Saúde de Crianças e Adolescentes e aí, novamente, encontramos algumas pistas sobre o que é realmente necessário na infância: diálogo e respeito; regras claras de convivência; olhar de cuidados; oportunidades e alternativas saudáveis; desenvolvimento de valores éticos; apoio e resiliência familiar.
As escolas do grupo Bahema Educação também têm um guia
Inspirados pela publicação espanhola Más que un móvil da Unicef - equipes de Ensino Fundamental 2 das Bahema Educação também se debruçaram sobre o tema e criaram o Guia ‘Celular, qual a idade certa?.
Entre outros temas, o guia discute o grau de responsabilidade que a criança passa a ter, na grande maioria dos casos, incompatível com o que de fato pode dar conta, não só em termos práticos, mas também emocionais.
Por aqui seguimos nos “Desconectando” e a novidade é que em setembro o projeto vai se estender para o mês todo. Ou seja, um mês inteiro sem celular. Nossa intenção é coletar depoimentos de estudantes e de familiares, para que a tão desejada “proibição” seja uma construção coletiva, pautada na experiência e que não fique restrita ao ambiente escolar.
É importante reduzir o uso de telas em casa também!
Afinal de contas, já não é de hoje que enfatizamos: Aprender é uma Experiência Viva.
E você, também está convidado(a) a se Desconectar com a gente. Bora?
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