por Fernando Cardoso, coordenador pedagógico de Ensino Fundamental 1 e Atividades Complementares da Escola Viva
A ideia de representante de turma não é uma novidade, muitos de nós vivenciamos essa experiência quando éramos estudantes. Contudo, ao longo do tempo, a função do representante - que era quase a de um “ajudante do dia" - veio se transformando.
O que era uma função burocrática (ajudar na entrega das atividades, olhar agendas, recolher lições) deu espaço para os estudantes exercerem atitudes de protagonismo, dentro e fora do ambiente escolar.
…do começo
Com a palavra os representantes de turma de 2023 da Escola Viva:
“Ser representante é uma responsabilidade grande. Basicamente porta-voz do seu grupo. Alguém que vai ajudar os outros a melhorar a escola para que tudo fique mais fácil e feliz. E, sendo uma criança fazendo isso, a escola melhorar, é incrível”. (A., 10 anos)
“Para mim representa ter uma grande responsabilidade. O compromisso de me doar, doar meu tempo para melhorar a escola para todo mundo e me ajuda a deixar todo mundo feliz e meu foco é deixar todo mundo feliz”. (R., 9 anos)
“Acho que poder ajudar os outros com problemas que estão tendo na escola e não necessariamente na sala, isso é muito importante. Principalmente conflitos, me faz sentir mais feliz ajudar a resolver. Eu não gosto de conflitos”. (I., 9 anos)
“Eu adoro ser representante e ajudar as pessoas. Claro que tem algumas críticas, mas eu acho muito legal. Fico feliz por terem me escolhido, sempre temos ideias e o representante só faz elas se realizarem” (M., 6º ano)
“Em uma escola como a Viva, nós, representantes, temos a função de constituir nossas turmas. Aqui, um representante pode expor de forma aberta as opiniões e sugestões de suas salas, criando discussões pertinentes para que possamos estabelecer um ambiente escolar cada vez mais completo e justo para todos. Na Viva, temos um comprometimento muito grande com o protagonismo dos alunos, por isso, o papel que exercemos na escola é tão importante para nós.” (L. R., 2ª série EM)
“Na minha opinião, eu acho que ser representante de sala é muito mais do que levar as questões da classe para a coordenação. É criar vínculos com as pessoas, uni-las e criar um local de respeito entre cada um. Em uma escola como a Viva, que escuta os alunos, que é inclusiva, e que respeita as diferenças de todos, acho que esse papel se torna muito mais importante.” (V., 3ª série EM)
Como vocês puderam notar nas falas dos próprios alunos e alunas, representar o seu grupo é defender os interesses do coletivo dentro da escola é, muitas vezes, o primeiro passo de uma longa jornada como cidadão.
Mas como funciona na prática?
Aqui na Escola Viva, tudo começa com a eleição!
A escolha é sempre democrática, mas a forma é sempre combinada anteriormente com o grupo. Algumas turmas seguem o caminho mais comum: o docente pergunta quem gostaria de se candidatar, e somente os candidatos(as) escrevem um discurso.
Depois de ouvir todos os discursos, o professor ou professora entrega uma cédula de votação individual, para que todos e todas possam votar, garantindo a premissa de que o voto é individual e secreto. O primeiro(a) mais votado(a) é o representante; e o segundo(a) mais votado, o vice-representante.
Já tivemos turmas que se organizaram como um “partido político”, pequenos grupos se juntam e decidem quem será candidato(a) a representante e vice-representante, depois escolhem quem cuidará da campanha para promover os seus candidatos(as), quem fará as divulgações, quem cuidará da organização da equipe e assim por diante.
Neste exemplo, leva-se um tempo maior para finalizar a votação, mas a participação de todos e todas é garantida.
Independentemente da forma de eleição, o que buscamos é que seja legítima e democrática. Nossa sugestão é trocar os representantes semestralmente, assim garantimos a rotatividade.
Durante as rodas de classe, os representantes organizam as falas, fazem a ata e são responsáveis por verificar se aquilo que foi acordado realmente aconteceu.
Nas assembleias mensais com a gestão da escola, são eles que levam os interesses da turma e que depois compartilham com os demais o que ficou decidido. Os representantes têm voz ativa nessas reuniões e sempre chegam com a pauta pronta para transformar a escola em um lugar cada vez melhor para se conviver. Tais ações podem fazer da escola um espaço de maior pertencimento, de melhor convivência e um grande palco de oportunidades de desenvolvimento individuais e coletivos.
É realmente encantador ver os estudantes mobilizando-se para participar das assembleias e defender os interesses do grupo.
Alunos e alunas têm a oportunidade de argumentar, expor, debater, ouvir e refletir sobre as ideias que foram elaboradas de forma coletiva e que nem sempre é a sua ideia individual.
A escola só se transforma se as pessoas se transformarem dentro delas!
Ser representante de turma pode ser um importante exercício de protagonismo para aqueles e aquelas que, em breve, atuarão na sociedade e poderão fazer com que ela seja ética, justa e democrática.
E por que protagonismo?
Estudantes protagonistas têm um papel ativo no próprio aprendizado, de modo geral, quando exercem o protagonismo dentro da escola. Ficam mais curiosos sobre a complexidade do mundo, engajam-se para encontrar soluções criativas para problemas inusitados, têm mais autonomia na resolução de conflitos e desenvolvem o pensamento crítico, afinal valorizam o trabalho em equipe.
Aos docentes, cabe o desafio de oportunizar situações para que todos possam exercer o protagonismo, alternando e valorizando os diferentes pontos de vistas e planejando ações que possibilitem o desenvolvimento do papel ativo do estudante em sua própria aprendizagem.
E você, professor ou professora, gestor ou gestora, tem dado voz para os estudantes da sua escola?
Se queremos de fato a formação integral do estudante, temos que saber ouvir as suas ideias e desejos, respeitar suas propostas e oportunizar o direito de colocar-se com liberdade e responsabilidade sobre todas as questões relacionadas ao dia a dia escolar.
A escola deve ser um ambiente em que o estudante seja incentivado a ajudar os outros e a se importar com quem convive, sejam alunos, alunas, famílias e colaboradores escolares.
Vale lembrar que estamos falando de um protagonismo que acontece “de verdade”, e não “de vez em quando”.
Ansiamos por um protagonismo como potência dentro de ações coletivas e pautado no bom convívio.
…ao fim
A escola também tem a função social de educar crianças e jovens para o exercício da cidadania.
O protagonismo dos estudantes é trabalhado nas rodas de conversa, nas assembleias de classe, no respeito às regras de convivência e ao regimento escolar, no comprometimento com a assiduidade e a pontualidade e também quando são representantes de turma. Ações precisam de espaço para acontecer na rotina escolar, de forma planejada e intencional.
Quando tem representantes de turma e, de fato, faz com que tenham protagonismo na rotina escolar, a escola está oportunizando o pensamento crítico, a escuta sensível, a empatia e ensinando a valorizar a importância de acolher ideias diferentes da sua e principalmente a zelar pela qualidade do convívio.
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Projetos de vida: como a escola pode ajudar jovens estudantes a construírem seus futuros
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