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Criando um outro - tem personagem dentro de mim?

Escrito por Escola Viva | 12 de Abril de 2024

por Susanna Oliveira - Estagiária de Arte da Escola Viva

“Criando um outro” foi o título escolhido para a Proposta Integrada (P.I.) de Teatro pelos alunos e alunas do 4º e 5º anos do Ensino Fundamental da Escola Viva.

Nossos encontros contam com preparação corporal, jogos teatrais, criação de cenas e conversas sobre as práticas.

Me preparar para fazer e refletir sobre o que fiz.

Defender o Teatro na escola não é tarefa difícil.

A cada encontro, é possível perceber a linguagem teatral fazendo sentido tanto para aqueles que a experienciam pela primeira vez quanto para os que já tiveram algum contato.

Podemos tecer relações entre as práticas já conhecidas e o que é novo.

Primordialmente, só existe teatro se há alguém fazendo e um outro alguém assistindo.

Durante as aulas, a necessidade do “outro” passa a ter sentido quando pensamos na cena. Aprofundando o contato com as práticas, é possível ampliar a necessidade do outro como uma sabedoria para a vida.

Num momento de tanto individualismo intensificado pelo mundo digital, tomar consciência da necessidade de se relacionar faz diferença nos modos de existir.

Não nos olhamos nos olhos, não percebemos o que está ao nosso redor, não damos tempo para que o que acontece nos afete.Somos consumidos pelo modo automático.

(Ilustração de Odilon Moraes no livro  livro “Os Invisíveis” de Tino Freitas)  

Se não as relações, o quê?

O que há de mais humano do que relacionar-se?

O teatro pode ser um convite à humanização.

O convite à pausa pode parecer desafiador.

Repousar o olhar sobre a sua respiração, sobre como os seus pés tocam o chão. Perceber o corpo depois de uma manhã sentado tendo aulas. Ter espaço para rolar no chão. Ouvir bastante e gritar quando couber.

Aos poucos, compreender que, ali, no palco, tudo é possível.

Poder construir esse espaço de criação e reflexão dentro da escola com os estudantes de 4º e 5º anos e com o Carlos, também estagiário de Artes, tem sido muito precioso.

Dentro da aula de Teatro, os saberes partem do respeito - pelo espaço, pelo corpo, pelo outro, e especialmente, por você mesmo.

Quanto de autoconhecimento não mora aí?

Acessar os próprios desejos, reconhecer a natureza do desejo e dosar quando cabe realizá-lo e quando não. Saber que, ali, quando um perde, todos perdem.

Perceber que certo e errado são pontos de vista. Perceber que uma história tem 2, 3, 5 ou até 10 lados.

Questionar. Aprender a duvidar. Aprender a escolher.  

Para mim, não há como separar o fazer teatral do autoconhecimento.

Pessoas sensíveis e inteiras em si podem escutar os ambientes, as pessoas, as situações e escolher como agir sobre elas, ou não.

Além do desenvolvimento pessoal, há uma potência dentro do teatro, talvez a mais conhecida, que é: relacionar-se criticamente com os assuntos do mundo e pensar novos mundos, imaginar. Imaginar é muito poderoso.

Podemos pensar sobre tudo através dessa linguagem. Podemos imaginar novas soluções para problemas antigos e esperançar novos caminhos.

O teatro tem matéria prima Humana. Ele nos obriga a estar diante de outro ser humano e isso é valioso. Ser ator é ser um Ser Humano profissional.

“Vejam bem o procedimento desta gente:

Estranhável, conquanto não pareça estranho

Difícil de explicar, embora tão comum

Difícil de entender, embora seja a regra.

 Até o mínimo gesto, simples na aparência,

Olhem desconfiados!

Perguntem

Se é necessário,

a começar do mais comum!

E, por favor, não achem natural

O que acontece e torna a acontecer

Não se deve dizer que nada é natural!

Numa época de confusão e sangue,

Desordem ordenada,

arbítrio de propósito,

Humanidade desumanizada

Para que imutável não se considere;

Nada.”

(BRECHT, A Exceção e a Regra, 1929/30).

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